quarta-feira, 4 de agosto de 2010

A tentação... Quanto vale a eternidade?


Sentada sobre os escombros do meu velho quarto, como faço todos os dias, escrevo. A julgar pelo tempo que estou nesse mundo, já escrevi de tudo, sobre tudo.
Em 2010, após concluir o ensino médio, vagando pelas ruas do Recife Antigo um senhor me chamou a atenção. Sentado em um banco defronte a um beco escuro, ele me convida ao seu encontro. Seu nome: Frederich Voich, um velho alemão, que aparentava uns 80 anos, face e braços repletos de cicatrizes, olhos de um azul inigualável já marcados pelo tempo. O que o Sr. Voich oferecia: viver eternamente. Proposta bastante tentadora, afinal seria o que todos almejavam e buscavam. O desejo de ver minha família crescer, de poder ver a evolução do ser humano, do mundo, era maior do que qualquer medo ou apreensão. Tudo o que eu teria que fazer era tomar estranho líquido azul. Após escutar algumas coisas vividas por ele, aceitei. O líquido desceu rasgando, como se por ironia estivesse dividindo minha história, em um antes e depois daquele momento. Era indescritível a felicidade do senhor. Logo após, mandou-me ir embora, adentrou mancando e já sem forças pelo beco estreito e nunca mais o vi.
Hoje, 926 anos depois, continuo com o mesmo rosto como se o tempo para o meu corpo houvesse parado, porém uma aparência cansada, triste, infeliz.
Vi meus filhos e netos nascerem e morrerem, meus bisnetos serem mortos pelo segundo Hitler por não quererem se curvar as suas ordens. Presenciei meu marido ser morto aos 75 anos a tiros pela polícia brasileira, que o mataram por mera diversão. A evolução das máquinas e robôs, aqueles que os homens diziam ser o futuro, aqueles que vários cidadãos apoiaram e pagaram pra ver, revoltaram-se contra seus próprios criadores e os mataram. Acompanhei as águas do mar e das chuvas invadirem cidades e países e alguns séculos depois a seca atingir tudo, tornando aquilo que a água destruíra um grande deserto de corpos e escombros.
Nove guerras, por nove motivos diferentes, nos quais a água, as florestas, o petróleo, o ouro... Todos foram acabados. Governos que prometiam o que nunca cumpriram, a destruição das escolas, praças e igrejas, o massacre das crianças...
O fato de não saber como produzir o líquido azul me afligia em meio aquilo tudo, me arrancava o sono noites a fio, eu não queria aquela vida, não queria... Queria poder produzi-lo e dá-lo a uma pessoa que estivesse passando perto de mim, qualquer um... Eu desejei, desde a primeira destruição, nunca tê-lo tomado.
Após presenciar tanta desgraça, a morte de cada pessoa que amava, de cada ser vivente, eu queria voltar no tempo, encontrar novamente o Sr. Voich, ouvir suas histórias até então fantasiosas, negar o estranho líquido a mim oferecido e seguir.
Afinal, por que negar a morte? Medo de parar em um lugar pior depois dela? A vida eterna neste lugar pode ser o próprio inferno.

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